segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Daniela

Há meses que estou com esse texto pronto. Mais pronto estava ele do que eu para postá-lo. Segue.

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Esse texto, embora nostálgico, tem o puro e simples propósito de tentar trazer à tona o fato de que as pessoas vêm e vão, e nada podemos fazer para evitar.

Esses dias, estranhamente, me veio à cabeça uma pessoa muito querida que eu julgava esquecida. Não pensava nela há mais de ano. É uma ex-professora minha, por quem eu tinha um carinho muito especial. Seu nome era Daniela.

Ainda não sei exatamente o que ela viu em mim, mas considerava-me especial e tratava-me de modo diferente, um tanto protetor. Ela devia ter uns 24 anos, pouco mais ou menos. Lembro da tarde em que ela deixou sua sala de aula um instante, chamou-me de canto e, com um pacotinho na mão, disse algo assim: "É igual à minha. Use sempre, que vai te dar proteção." Era uma pulseirinha de pequenas bolinhas peroladas, donde pendia uma cordinha de contas com uma cruz; Uma miniatura da dela, que se encaixou perfeitamente no pulso de uma menina de seus oito anos.

Eu raramente esquecia de coloca-la de manhã - ou melhor, de pedir que minha mãe a pusesse em mim. Eu me sentia especial por usá-la, como se fosse uma espécie de amuleto. Sei que ela me tratava como uma irmã caçula, e eu a admirava como uma irmã mais velha. Com o tempo, começou a me chamar para sair. Íamos à casa dela, a eventos de caridade dos quais ela participava, à loja do pai dela. Às vezes ela ia em casa me visitar. Me trazia lembrancinhas, mimos, e eu me sentia querida, embora não conseguisse me livrar da sensação de que aquilo tudo era estranho e incomum.

Um dia ela faltou na escola. Estranhei, perguntei à secretária, mas ela me ignorou. No outro dia, ela faltou de novo. E no outro, e no outro, e no outro. E foi assim que descobri que ela teve uma briga com a dita secretária, arrumou a trouxinha e foi-se embora. Estranho, mas não lembro direito do que aconteceu depois. Nem do que eu senti, pensei ou fiz. Lembro que ela se foi, e só, sem se despedir ou me ligar mais tarde, nada. Era como se eu tivesse despertado de um transe e minha vida seguisse seu curso comum.

No ano seguinte, lembrei do aniversário dela. Liguei, ignorando o fato de que ela não houvera ligado no meu último, inventando desculpas para mim mesma. Ela foi educada, mas não carinhosa ou gentil como era antes, e isso me chateou e revoltou. Não liguei mais, nem ela me ligou, e esse foi o maior dos motivos de eu ter me esquecido dela. Ou pelo menos era o que eu pensava até hoje de manhã, quando tudo o que aqui escrevi veio num turbilhão em minha mente, inesperadamente, assustando-me.

Foi uma fase muito agradável. Momentos aprazíveis, mas só momentos, nada mais. Há pessoas que passam pela nossa vida, nos deixam lembranças maravilhosas, mas a gente nem percebe quando elas se vão, até que uma desas lembranças irrompa em nossa mente, envergonhando-nos do esquecimento. Surgem novas pessoas, lembradas ou não, mas sempre marcantes, cada uma a seu modo. É quase imperceptível a influência que algumas pessoas possuem sobre nós, e às vezes nem reparamos...

M.G.M

domingo, 7 de agosto de 2011

As gramáticas classificam as palavras em substantivo, adjetivo, verbo, advérbio, conjunção, pronome, numeral, artigo e preposição. Os poetas classificam as palavras pela alma porque gostam de brincar com elas e pra brincar com elas é preciso ter intimidade primeiro. É a alma da palavra que define, explica, ofende ou elogia, se coloca entre o significante e o significado pra dizer o que quer, dar sentimento às coisas, fazer sentido. Nada é mais fúnebre que a palavra fúnebre. Nada é mais amarelo do que o amarelo-palavra. Nada é mais concreto do que as letras c, o, n, c, r, e, t, o, dispostas nessa ordem e ditas dessa forma, assim, concreto, e já se disse tudo, pois as palavras agem, sentem e falam por elas próprias.

A palavra nuvem chove. A palavra triste chora. A palavra sono dorme. A palavra tempo passa. A palavra fogo queima. A palavra faca corta. A palavra carro corre. A palavra palavra diz. O que quer. E nunca desdiz depois. As palavras têm corpo e alma, mas são diferentes das pessoas em vários pontos. As palavras dizem o que querem, está dito, e pronto, as palavras são sinceras, as segundas intenções são sempre das pessoas. A palavra juro não mente. A palavra mando não rouba. A palavra cor não destoa. A palavra sou não vira casaca. A palavra liberdade não se prende. A palavra amor não se acaba. A palavra idéia não muda. Palavras nunca mudam de idéia. Palavras sempre sabem o que querem. Quero não será desisto.

Sim nunca jamais será não. Árvore não será madeira. Lagarta não será borboleta. Felicidade não será traição. Tesão nunca será amizade. Sexta-feira não vira sábado nem depois da meia-noite. Noite nunca vai ser manhã. Um não serão dois em tempo algum. Dois não será solidão. Dor não será constantemente. Semente nunca será flor. As palavras também têm raízes mas não se parecem com plantas, a não ser algumas delas, verde, caule, folha, gota. As células das palavras são as letras. Algumas são mais importantes que outras. As consoantes são um tanto insolentes. Roubam as vogais pra construírem sílabas e obrigam a língua a dançar dentro da boca. A boca abre ou fecha quando a vogal manda.

As palavras fechadas nem sempre são mais tímidas. A palavra sem-vergonha está aí de prova. Prova é uma palavra difícil. Porta é uma palavra que fecha. Janela é uma palavra que abre. Entreaberto é uma palavra que vaza. Vigésimo é uma palavra bem alta. Carinho é uma palavra que falta. Miséria é uma palavra que sobra. A palavra óculos é séria. Cambalhota é uma palavra engraçada. A palavra lágrima é triste. A palavra catástrofe é trágica. A palavra súbito é rápida. Demoradamente é uma palavra lenta. Espelho é uma palavra prata. Ótimo é uma palavra ótima. Queijo é uma palavra rato. Rato é uma palavra rua. Existem palavras frias como mármore. Existem palavras quentes como sangue.

Existem palavras mangue, caranguejo. Existem palavras lusas, Alentejo. Existem palavras itálicas, ciao. Existem palavras grandes, anticonstitucional. Existem palavras pequenas, microscópico, minúsculo, molécula, partícula, quinhão, grão, covardia. Existem palavras dia, feijoada, praia, boné, guarda-sol. Existem palavras bonitas, madrugada. Existem palavras complicadas, enigma, trigonometria, adolescente, casal. Existem palavras mágicas, shazam, abracadabra, pirlimpimpim, sim e não. Existem palavras que dispensam imagens, nunca, vazio, nada, escuridão. Existem palavras sozinhas, eu, um, apenas, sertão. Existem palavras plurais, mais, muito, coletivo, milhão.

Existem palavras que são palavrão. Existem palavras pesadas, chumbo, elefante, tonelada. Existem palavras doces, goiabada, marshmallow, quindim bombom. Existem palavras que andam, automóvel. Existem palavras imóveis, montanha. Existem palavras cariocas, Corcovado. Existem palavras completas, elas todas. Toda palavra tem a cara do seu significado. A palavra pela palavra tirando o seu significado fica estranha. Palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra, palavra não diz nada, é só letra e som.

Adriana Falcão

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

When you wish upon a star,



makes no difference who you are
Anything your heart desires will come
to you



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Quem não tem um sonho, que atire a primeira pedra.

E quem nunca realizou um sonho... Bom, sugiro fervorosamente que corra atrás disso o quanto antes.

Para uma vida que costumava ser monótona - porém não menos interessante e feliz -, a minha agora está um sonho. E, sabe, isso só faz com que seja mais fácil manter os pés no chão.

Ah, Disney... Um conto de fadas real, palpável, impossível não sair de lá pelos menos um pouco mudado.

Eu, como toda garotinha, já quis ser uma princesa. Quando criança, pensava que para toda moça existia um príncipe encantado. Qual não foi minha desilusão ao crescer e conhecer o mundo real. Com uma infância banhada em Disney, especificamente "a Bela e a Fera" - meu desenho favorito do mundo todo -, quem disse que contive as lágrimas ao tirar uma foto com Bela, ou ao ver o espetáculo no Hollywood Studios... Ali, eu me senti a princesa que eu sonhava ser quando criança. Na verdade, ali eu fui criança outra vez. E percebi que a infância, que eu julgava me esvair com tanta rapidez, sempre existirá.

Lá fui princesa, fui bruxa, tive um castelo de Cinderella e tive Hogwarts. Lancei encantamentos e feitiços. Lá, em frente ao castelo com que tanto sonhei, vivendo de fato o momento que me imaginei vivendo por anos, sob a luz dos fogos de artifício, rodeada de pessoas de todos os lugares do globo, todas compartilhando da mesma emoção, eu simplesmente acreditei. Conheci uma nova sensação, uma mensagem que todos os parques transmitem, desde o Sea World ao Magic Kingdom: Believe!

A sensação de descer em Miami foi indescritível. Mais ou menos quatro da manhã, completamente fora de fuso. Lá, nos Estados Unidos, vi o quanto somos diferentes, e o quanto somos iguais. Apesar de termos costumes e línguas diferentes, comermos comidas diferentes, termos diversas cores de pele, cabelo, olhos, tudo, apesar de tudo isso, somos todos seres humanos, e a lua que eu via lá em cima era a mesma lua para a qual eu olhava sonhadoramente da minha janela todas as noites.

Enfim entendi o que é sentir saudades do Brasil, da minha casa, de ouvir as pessoas falando português (se bem que o que nós vimos de brasileiros por lá não foi brincadeira).

E agora cá estou eu, no meu quarto de novo, olhando para a mesma lua, me sentindo tão perto e tão longe ao mesmo tempo, com a sensação mais forte do que nunca de que eu vou voltar. O quanto antes. Hey, Disney, lá vou eu de novo!!