sábado, 14 de setembro de 2013
Últimos tijolos
Foi-se o tempo em que eu adotava árvores, e não gostava de férias, e tinha uma paixão platônica por um professor. Foram quatro anos atualizando esse blog uma vez por milênio, mas com muito prazer. Ao invés de reinventar o passado, decidi romper com ele. Não vou mais esconder meus textos das pessoas, mas esse blog em especial vai ficar quietinho, em segredo, acessível apenas aos antigos e seletos leitores - a quem eu agradeço muito, muito demais. Meu sonho de ser escritora não acabou. Na verdade, só começou. E o próximo passo é esse: marinameireles.blogspot.com.br.
segunda-feira, 26 de agosto de 2013
Mais um sobre a (in)certeza
Estou sentada em frente ao computador, fingindo indiferença quando na verdade meus dedos tremem - só um pouquinho. Meu CPF, meu RG, meu nome, são digitados com cuidado especial, e ainda assim tenho a impressão de que está tudo errado; dou uma conferida no documento, por desencargo de consciência. Sou direcionada a uma janela simples e objetiva: "Carreira e curso". Eu sei o que eu quero. Mas alguma parte de mim guia o cursor até "Letras - CARREIRA 235". Em um milésimo de segundo, todo um futuro se desenrola diante dos meus olhos.
Eu me vejo. E estou seca.
Não fisicamente, claro. Na verdade, estou até bastante bem. Uma mulher já madura, roliça, pálida de tanto ficar em casa, escrevendo. Meu futuro eu desvia o olhar do texto que revisava para estudar um gato, que espreguiça no sofá. É minha única companhia na flor dos meus quarenta anos. Um gato. Tenho que terminar a revisão do texto, mas o cansaço me domina (cansaço de quê?). Vivo de eventuais revisões. Corroída pelo orgulho, recusei duramente ser professora. Meu sonho de escrever um livro parece cada vez mais distante - a inspiração não vem. Apenas reviso textos. Não há mais sonhos, os olhos opacos, a melancolia própria de alguns autores bem-sucedidos. Mordisco uma cream cracker, suspiro e volto ao trabalho.
Saio do transe tão rápido quanto entrei. Clico em "Medicina Veterinária - CARREIRA 510", e imediatamente vejo a mim mesma, ainda jovem, queimada de sol, radiante. Cuido do meu cavalo, na minha fazenda, e estou feliz. Mais que isso: estou em paz. Posso trabalhar tranquila no meu livro, à sombra de uma árvore. As ideias simplesmente fluem. Tenho marido, e filhos, e minha própria clínica e cavalos e cães e meu livro. É tudo o que eu queria.
Entrego à minha mãe o boleto com a taxa de inscrição. Não sei se o futuro será como vi, mas acho que é assim que funciona a intuição; você simplesmente conta até três e dá um tiro no escuro. E ignora o medo, e o aperto no coração. Minha mãe suspira, a voz carregada de orgulho:
"Minha filha vai ser médica..."
quarta-feira, 26 de junho de 2013
Se o telefone não tocar, sou eu
Envergonho-me um
pouquinho de falar sobre como descobri esse texto e esse brilhante autor, mas
não pude deixar de transcrevê-lo aqui. É muito do que já tentei expressar e não
consegui.
"Certa
vez vi essa frase em um nick de msn. Identifiquei-me de pronto. Busquei a
autoria, mas não encontrei. Que seja: o certo é que o autor, nalgum momento,
pensou em algo que eu pensaria. Isso é o gostar (ou, como é
óbvio, é a essência da identificação). "Se o telefone não tocar,
sou eu" me parece a tradução, em atitude literária, da (minha) falta
de atitude. É buscar na ausência aquilo que nos constitui. É olhar
melhor para uma característica, e torná-la mérito. Ponto de vista: palavra.
O que me interessa
na frase, no entanto, é o tanto que ela repercute: é o restante das
coisas que ela representa. Além de ser o cara que não irá te fazer uma ligação,
também sou aquele que não irá mandar a mensagem, que não mandará o
e-mail, e que não falará contigo mesmo suspeitando que daria uma boa conversa.
Isso não quer dizer que não haja vontade. Há mais que isso: há hesitação. E
hesitar é introduzir o desistir. Medo de inconveniência. Despeito,
complexo, e uma resignada vontade de deixar pra depois.
Perguntam-me quantas
pessoas deixei de conhecer devido à minha timidez indevida. Acho que
talvez me seja necessário deixar de conhecer muitas pessoas para que
eu conheça melhor as poucas que me bastam, ou pra não me desconhecer por
completo. Se não telefono e não escrevo, é previsível que meus principais
amigos também não telefonem, e é por aí mesmo. E como se dá a
relação? É desse jeito: todos tentando provar pra si mesmos que a solidão
não é tão ruim. Acho de verdade que não é. Todos nós, esperando
algo. O silêncio diz muito. Atrai-nos.
O
que me alegra, então, é o valor que ganham as manifestações de carinho em
que estou envolvido. Não digo às pessoas que as amo, não distribuo abraços
artificialmente calorosos, e não coleciono melhores amigos. Por tudo isso, cada
pedacinho de afeto é a mim um grande pedaço de alegria. Não é fresta
aberta pela carência: é sinceridade. Minha avó, ídolo maior, nunca
disse que me ama. Nunca precisou. Meu grande amigo não gosta de msn nem de
telefone. Anda se acostumando. A maioria de minhas palavras não suportam serem
escritas. Falam sozinhas e silenciosas. Mortas-vivas.
Os
sentimentos são mais autênticos enquanto não são manifestados.
Têm a pureza instantânea do impensado, do imponderado, do indizível.
(...)
Àqueles
que não ouviram o telefone tocar, saibam que este é meu jeito de dizer
"Oi..., tudo bem?""
quinta-feira, 25 de abril de 2013
Alma sóror
Então um dia eu acordei e decidi ser perfeita; gentil, prestativa, alegre e altruísta. Decidi que ouviria mais os outros, não zombaria de ninguém, nem de brincadeira, seria uma boa aluna, boa filha e boa pessoa, porque eu queria ser igual a uma princesa, e igual a Jesus Cristo. Ele era tão bondoso, eu devia ser bondosa também.
Mas eu era tão pequena, e tão inocente. Hoje, sou ainda tão inocente quanto a pequena eu. E ainda quero ser boa - perfeita, não, nunca mais - mas, céus, é tão difícil! Certas pinceladas da elegância ou das boas maneiras vão contra alguns instintos naturais, que estou experimentando não refrear tão duramente. Às vezes me pego dividida entre o prazer de ser certinha e perfeccionista e o prazer de fazer algo ousado - não errado, apenas atípico. Meu principal escrúpulo é: NÃO MACHUCAR NINGUÉM. Todo o resto está aí, ao alcance das minhas mãos.
O leitor com certeza já se sentiu assim. Até que ponto devemos respeitar os padrões da finesse, e em que medida podemos simplesmente soltar as amarras e... nos permitir? Devemos sobrepor a etiqueta à expressão da nossa essência? Estou experimentando correr o risco de não o fazer, e os resultados têm sido deliciosamente novos.
São as asas se abrindo. O gosto da liberdade. Os hormônios. Ou talvez sejam só gases.
sexta-feira, 19 de abril de 2013
O subconsciente e a necessidade de autoconsolo
Monólogos absolutamente fictícios e genéricos.
2) OS TRABALHOS!!! Merda, sabia que estava esquecendo de alguma coisa... Deixei em cima da mesa! Eu sou muito burra. Acho que não vou aprender nunca. Ai, caramba, se eu pedir pra minha mãe ir buscar, ela vai ficar putíssima. E agora?! (aflição) A última vez que isso aconteceu foi com Filosofia... Eu até anotei no diário. Nunca mais trago esse diário pra escola. Muito perigoso! (aflição diminuindo) Fora que eu nem sou mais como eu era na época em que eu escrevi. Cara, tanta coisa mudou...
Que bom, porque eu era uma boba. Devo ser ainda, só que menos. (aflição se transforma num sussuro incômodo pra caramba da mente inconsciente) Mas, calma. Até pouco tempo atrás eu estava tão aflita... Mas por que, mesmo? ... A PORRA DOS TRABALHOS!!!
Cada um desses monólogos hipotéticos provavelmente não durou mais de trinta segundos hipotéticos.
terça-feira, 26 de março de 2013
Eu sou um adjetivo!
Cada palavra que ele diz é como passar sal numa ferida aberta.
- Pare de depender dos outros. Seja quem te faz feliz.
Eu tento, mas sou como uma gota de chuva no asfalto quente. Eu sou uma vela dura e fria; ele é o calor da chama. Sou o ponteiro das horas, e ele o dos segundos. Ele é a melodia, se eu for uma lira velha. Eu não faço sentido sozinha! É ele o substantivo.
É como sal numa ferida.
- Pare de depender dos outros. Seja quem te faz feliz.
Eu tento, mas sou como uma gota de chuva no asfalto quente. Eu sou uma vela dura e fria; ele é o calor da chama. Sou o ponteiro das horas, e ele o dos segundos. Ele é a melodia, se eu for uma lira velha. Eu não faço sentido sozinha! É ele o substantivo.
É como sal numa ferida.
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013
A dor de deixar para trás
Estou a mais ou menos dez meses de me formar e terminar a escola para sempre. Eu frequento a escola desde os quatro meses de idade, e não me imagino em outra rotina. É claro que as mudanças entre o colégio e uma faculdade ou um cursinho não são tão gritantes - continuarei estudando, afinal. Mas são mudanças, e, como todas na vida, me deixam assustada. É como respirar fundo e dar passos no escuro. E, acho que pouca gente sabe disso, eu morro de medo do escuro.
Minha vida foi sempre muito segura. Sempre me senti amada e cuidada, e não costumava olhar para os dois lados antes de atravessar a rua, pois sempre havia alguém maior segurando minha mão. Não sei até que ponto isso foi bom pra mim, e não discutirei isso agora. Isso fez crescer um desejo ardente e idiota de libertação, que ainda possuo, mas que se atenua conforme minhas amarras são cortadas. É o velho colocar a felicidade onde você não está; quando você chega lá, vê que não é como imaginava. Sei que é só um tranco, e que logo me acostumarei. Na verdade, gosto de ter minha própria vida. Tudo tem vantagens e desvantagens, afinal.
Quanto à escola, especificamente: não vou me alongar sobre o amor que tenho ao colégio em que estudei nos últimos seis anos. Soaria clichê e eu seria acusada de puxa-saquismo. Contudo, não posso deixar de falar que eu amo aquele lugar. Amo mesmo, é até esquisito. Parando pra pensar, eu amo de verdade verdadeira poucas coisas na vida. Minha escola é uma delas. Desde os professores aos meus amigos, desde o pátio estreito ao mural em cima do bebedouro! É como se eu fizesse parte desse lugar. E, pra falar a verdade, eu me sinto tão querida lá quanto entre meus familiares.
É por isso que dói tanto ir embora. As pessoas com quem eu costumo conversar já estão quase me apagando com um porrete, e eu sei que eu encho sofrendo por antecipação. A essas pessoas que ainda não me deram um sossega palhaço, parabéns pelo saco admiravelmente grande. Eu odeio ser obrigada a ir embora. Essas são amarras que eu gostaria que nunca fossem cortadas. Muitos desses caras não têm ideia de que eu os amo. Mas, é isso, c'est la vie, não há nada que eu possa fazer. Há 78942189 caminhos à minha frente, e o que me cabe é escolher o que me parece mais viável. Sem mãos para me guiarem. Irrevogavelmente, atei laços de afeto que, espero, jamais serão desfeitos.
Chega de melodrama. Eu nem sei por quê estou postando isso, um texto tão íntimo, tão ridiculamente piegas e mal escrito. A possibilidade de TPM está descartada. Eu normalmente escrevo coisas assim, mas deixo salvas nos rascunhos, nunca publico. Por vergonha. Estou cansada de me podar, e ardendo de vontade de postar um texto impulsivo como esse. Como já dizia o filósofo Lulu Santos, vamos nos permitir!
terça-feira, 8 de janeiro de 2013
Oco, e vice-versa
Quando o tédio ameaçava tomar conta dela, surpreendeu-se cheia de uma vontade eufórica de escrever. Como milhares de vezes antes, sentou-se na cadeira giratória em frente ao monitor, abriu uma caixa de texto vazia, e então... nada. Frustrada, percebeu que não sabia sobre o que escrever. Decidiu vasculhar a mente em busca de algo do qual pudesse falar.
Pensou em escrever sobre livros. Na verdade, tinha vários textos sobre leitura já começados, mas por alguma razão não conseguia terminá-los. Talvez fosse porque ela não quisesse realmente falar sobre livros. Talvez o assunto tivesse surgido tantas vezes apenas porque, além de ser algo do qual gostava, faria com que parecesse intelectual. Sentiu vergonha de si mesma. Não, não queria escrever sobre livros.
Refletiu, e concluiu com pesar que não conhecia o mundo o suficiente para escrever sobre a atual conjuntura. Não acompanhava jornais - fato que, pensou ela, teria de ser mudado com urgência -, não gostava de História ou Geografia, seus conhecimentos filosóficos eram vergonhosos. Não poderia escrever sobre algo tão grande e do qual sabia tão pouco. Decidiu então não falar sobre o mundo.
Poderia falar sobre um fato interessante ocorrido com ela!... Mas não encontrou nenhum evento muito interessante em sua vida, e fazer com que acontecimentos desinteressantes se tornassem interessantes exigia uma habilidade narrativa que não possuía. Bufou, irritada.
Mas precisava escrever, fosse sobre o mundo, livros ou causos. Então decidiu-se: usaria e abusaria da metalinguagem. Descreveria sua luta, não com as palavras, como Drummond, mas com a essência de seu texto, e sua ânsia por escrever. Escrever apenas por escrever. Escrever sobre o ato de escrever.
Talvez devesse mesmo ter escolhido trabalhar com as Letras, pensou ela. Lembrou-se que não possuía assunto nem talento para tal. Abriu uma garrafa, inseriu seu texto, jogou-a no mar e foi dormir.
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